terça-feira, 30 de novembro de 2010

My Chemical Romance - Danger Days: The True Lives Of The Fabulous Killjoys (2010)



Energético, sujo, icônico, cativante... Existem muitos adjetivos para coroar o som dessa banda de rock alternativo não emo, apenas rock oriunda de New Jersey, EUA. O My Chemical Romance, ou MCR para os íntimos, iniciou suas atividades após os atentados do fatídico 11 de setembro, quando Gerard Way, frontman da banda, decidiu escrever uma canção sobre os atos terroristas. A música em questão, "Skylines And Turnstiles", se juntou a outras tantas canções, assim como se juntaram à banda Mikey WayRay Toro e Frank Iero - compondo assim o primeiro registro do grupo, I Brought You My Bullets, You Brought Me Your Love.

A partir daí, tours e mais tours mostraram ao mundo a obscura, eletrizante e cantarolável massa sonora destilada por Gerard e seus amigos. As apresentações não ficam para trás; a energia vibrante é a fusão da banda e da plateia, que não desafina e sabe de cor cada letra e ritmo. Logo depois do álbum Bullets (abreviação do trabalho já citado acima), um disco com ainda mais identidade surgiria para consolidar de uma vez por todas a presença da banda nos EUA e no mundo. Three Cheers for Sweet Revenge veio ao mundo em 2004, retomando a história iniciada no álbum anterior sobre um casal perseguido por vampiros assassinos. Se somados, temos a partir desses dois registros um conjunto de singles e ótimas canções como "Our Lady Of Sorrows", "Headfirst For Halos", "Helena", "You Know What They Do To Guys Like Us In Prison", "I'm Not Okay (I Promise)", " Thank You For The Venom" e "Cemetery Drive", dentre tantos outros sucessos mega conhecidos pelo público vibrante e incansável.

Em 2006, a obsessão por seres sanguinolentos dá lugar à busca pelo sentido da vida e questões existenciais são lançadas na forma de canções em tom de humor negro e sarcasmo. O álbum The Black Parade narra as desventuras de um paciente de câncer até o momento que ele se junta à Black Parade, onde rejeitados e injustiçados marcham em busca da libertação de seus pesares na vida. Este trabalho é muito bem aceito pelo público, mas também denota um lado até então pouco visto na carreira da banda: uma aderência sutil ao lado pop. Esta terceira bolacha da banda conta com os hits "Dead!", "Welcome To The Black Parade", " I Don't Love You", "Cancer", "Teenagers" e "Famous Last Words". Está claro que há mudanças também sutis no modo da banda executar as músicas; a pegada 'suja' dos dois primeiros trabalhos fica em xeque pelos arranjos bem executados do produtor Rob Cavallo, mas The Black Parade não decepciona.

Após o encerramento da fase anterior com o lançamento do dvd The Black Parade Is Dead, quatro anos dividiram em um hiato silencioso tudo o que o MCR construiu em sua curta, porém extensa carreira. Após segredos e especulações, uma amostra do que viria a ser o novo álbum da banda cai no YouTube: o inusitado vídeo da então inédita "Na Na Na (Na Na Na Na Na Na Na Na)". Nele, os membros da banda estão vestidos com estranhos uniformes coloridos portando armas coloridas atravessando um deserto.

- Killjoys, make some noise!

Essa é a ordem que os ouvintes do novo trabalho do MCR recebem ao iniciarem a jornada nada linear de um grupo de rebeldes em busca de justiça. Este novo trabalho é sim, bem conceitual, em controvérsia ao que Mikey Way, baixista, declarou em entrevistas: "Já fizemos três discos conceituais, então, para o próximo… não quero pensar em uma história definida. Escrevemos canções que soam como Rick Springfield, uma semana depois, se transformaram em algo como Children of Bodom. Sei que será um grande disco, só não sei como vai soar. Iremos nos surpreender tanto quanto todo mundo."

Danger Days é um álbum aparte na discografia da banda - não soa tão rock de garagem quanto Bullets ou Three Cheers, nem tão dark quanto The Black Parade. Este álbum fica, realmente, num mundo diferente, numa visão diferenciada que a banda concebeu como alguma reinvenção maluca. Seja como for, a perda de algumas características marcantes da banda são inevitáveis.

O álbum começa com a introdução do DJ Dr. Death Defying que, aliás, se faz presente em outras duas faixas - "Jet-Star and the Kobra Kid/Traffic Report" e "Goodnite, Dr. Death", que apesar de dar um tom narrativo a história dos Killjoys, acaba por soar como um tapa-buracos ao disco, exceto na introdução "Look Alive, Sunshine". A segunda faixa é a conhecida e camaleônica "Na Na Na (Na Na Na Na Na Na Na Na)", uma destoante balada rock'n'roll bem chiclete que se não gruda na mente, vicia em instantes. "Bulletproof Heart" é outra grande composição da banda e só peca por ser extensa e repetitiva da metade para o final.

"Planetary (GO!)" é uma das faixas mais diferentes vindas da banda. A música começa com sirenes intergalácticas e abre para um ritmo dançante e cheio de força que consegue levar a faixa numa batida incansável onde a letra expressa bem essa atmosfera: 'I can't slow down/I won't be waiting for you/Can't stop now/Because I'm dancing'. "The Only Hope For Me Is You" é o já citado segundo single e, se comparada com as faixas anteriores, perde um pouco do costumeiro peso das guitarras e bateria que a banda executa; por isso é uma das faixas que mais flertam com o pop e os refrões fáceis. Em "Party Poison" pseudônimo de Gerard para o personagem de cabelos vermelhos à la Ronald McDonald que ele encarna na história dos Killjoys, a banda volta com um som mais pesado e clima agitado berrando a plenos pulmões: 'Here comes the gang war/You're doin' alright/I got the answer/ 'Cause all the good times/ They give you cancer'.

"S/C/A/R/E/C/R/O/W" é uma canção vencedora: a voz de Gerard reverbera através de um efeito de eco como um rolo compressor cíclico de violão e a percussão navega em um amplo acordo. E ainda que timidamente, a banda se põe em uma situação gloriosa ao final e os deslizes anteriores são perdoados pelo requinte da ótima balada 'Summertime'. Pela primeira vez no disco, os caras têm uma grande sacada fazendo a sábia decisão de preparar o terreno delicado e sutil para então construir um hino triunfante, iluminado e contemporâneo de proporções verdadeiramente belas.

A música que se segue, "DESTROYA", vai causar estranheza na primeira audição, mas logo ressoa como uma façanha por parte da banda - os quase heavy metal riffs, misturados com os gemidos sexy de Gerard, justificam isso e fazem dessa música um achado vicioso. "The Kids From Yesterday", um futuro claro e único para o que podemos esperar da banda, é uma jóia cintilante: a banda atacando as suas angústias assim como os The Killers ou o MGMT o fazem num pop/electro glamuroso. A coisa toda termina com a revolta dos desenhos animados de "Vampire Money", quebrando a festa com um aríete de acordes e um extintor de incêndio para concluir o álbum em uma nota de surpresa e perplexidade.

MCR nunca deixou de desempenhar o papel de entreter, mesmo que com sofisticação, um público que o admira e o respeita por ser original na medida do possível. Eles caminham contra todas as direções seguidas por outras bandas do gênero que acabam por ser estritamente descartáveis. Todo grupo tem seu erro, todo grupo tem seu momento de dúvida sobre como continuar. Com o My Chemical Romance não foi diferente e para os grandes admiradores da banda meia palavra basta; dessa vez, faltou a energia presente nos álbuns anteriores. Espero, como fã deGerard e dos outros, que eles não se esqueçam nunca de quem eles são e que se mantenham afastados das mudanças quase extremas que permearam Danger Days.

Nota: 4,0

sexta-feira, 12 de novembro de 2010

Drums of Death - Generation Hexed (2010)


Bem à la Jack Skellington, a face pintada é o estilo inconfundível do Drums of Death- a.k.a. Colin Bailey. Você não estaria completamente enganado ao pensar que este álbum de estreia é, basicamente, parte da cena witch house. Em marchinhas funestas ou em batidas 8-bit mezzo Hot Chip ou mezzo qualquer outra coisa do gênero,Generation Hexed é mais sobre música pop eletrônica cantarolada do que necessariamente uma espécie de gothwave como Salem ou oOoOO.

O disco é bem bacana e vale a pena dar uma conferida, principalmente pela parte que diz respeito às diferentes sonoridades abordadas - justamente por isso, a bolacha não cai num contexto monótono e fora de linha como tanto se vê na cena eletrônica atual. O disco abre com "Karaoke", introdução onde Bailey explora um quase mantra banhado em sintetizador flutuante. Logo depois temos a impressão de um revival aos Talking Heads numa outra encarnação na faixa "Science & Reason" - algo como um jazzsofisticado com tendências roqueiras dançantes dos anos 80. Ainda assim, o hype só fica completo com o trio "Won't Be Long", "Lonely Days" e "Creak": de cara os melhores momentos do pacote.

Os synths de "Lonely Days" são de causar inveja até mesmo no mais experiente DJ e eu duvido que o ouvinte fique parado ao som futurista desta pancada sonora. "Creak" beira o desespero no seu clima dark arrastado e ambientado ao estilo da trilha sonora de algum filme de terror B - é diversão garantida para quem gosta de música ambiente. A certo momento, as batidinhas 8-bit dão um toque descontraído ao som carregado e esse contraste torna-se bem inventivo.

Bailey afirma que Generation Hexed "é a música pop nos meus termos". Ele tenta sempre descobrir como transformar a música em algo rápido, sujo e acolhedor. O disco conta com uma fórmula cativante: rave intensa como o ácido e melodias e batidas nervosas fincadas entre sintetizadores funky e muitos bleeps. A voz me lembra muito a de James Murphy, apesar de Colin gritar um pouco mais que o gordinho do LCD Soundsystem.

A segunda parte do disco não decepciona mas desacelera sutilmente; mas claro, nada que prejudique a audição desse pedacinho de céu. "All These Plans" é a baladinha para gregos e troianos. Já "Modern Age" é deliciosa para cantar junto ao coro de amigos na danceteria. O disquinho encerra com as firulas de "Voodoo Lovers (feat. Gonzales)" que, como o nome já diz, conta até com participação especial.

Muitos podem até discordar, mas se tratando de estripulias sonoras, o Drums of Deathdá um show a parte e, mesmo não lançando algo para figurar entre os melhores de 2010, dá margens ao que ainda pode-se esperar dele - pois se tratando de habilidade, criatividade e competência, Colin Bailey faz escola em muitos veteranos jurássicos do mundo da música. Para quem sabe aguardar, as expectativas para um próximo trabalho são altas - pelo menos da parte deste que vos fala.

Nota: 8,2


Joe Pug - Messenger (2010)


Joe Pug é um cara popular tentando fazer música honesta. Ele não é um grande experimentador e ele não tenta revolucionar a música. Pug usa o que outros cantores e compositores têm usado desde então: guitarra e violão, gaita e voz. Sua canções podem ser estruturadas ao estilo mais classudo do folk e elas vêm de um coração receptivo e um par de olhos abertos. Tudo parece ser tão normal, tão familiar...

E talvez esse seja o ponto de toda a matéria - Messenger é como um bom amigo ou um dia agradável de sua estação favorita. Ele tem o poder para aquecê-lo, ele está pronto para levá-lo pela mão quando ninguém está assistindo e isso te faz feliz apenas por estar perto. E assim que você internaliza todas as facetas do registro, ele não irá mais deixá-lo. Talvez isso seja um aspecto importante em chamar um álbum intimista.


Messenger não é particularmente triste - faixas como "The Door Was Always Open" tem uma boa movimentação: a instrumentação com tambores bem animados e a melodia do banjo e da gaita soam esperançosos e brincalhões. O mesmo se aplica para a excelente faixa-título, "Messenger", que conta com um som mais forte, evidente também em "Speak Plainly, Diana", que é a "mais difícil" dentre as faixas do registro. Mas ao longo destas faixas há claramente o que pode-se chamar de uma sonoridade não triste, mas nostálgica. "Disguised As Someone Else" ou "Unsophisticated Heart" são a prova viva de que, mesmo sem tanta inovação por parte de Joe Pug, a beleza extrema que a música pode assumir não deixa de ser contagiante - não é preciso ser o hype da contemporaneidade para criar músicas tão fascinantes.

Ao combinar urgência instrumental com melodias melancólicas, Pug conta histórias incrivelmente convincentes como na apaixonada "How Good You Are", que destoa em gaitas cortantes. Eu não tenho medo de dizer que Messenger é um forte candidato para o que há de melhor na lista de 2010. Se Joe canta sobre assuntos políticos, ele faz isso apenas como um bom cantor e compositor deve fazer - com estilo e não apenas por causa da provocação sem sentido. Você não tem que concordar com um bom cantor e compositor, mas você vai ouvir o que ele tem a dizer, pois ele realmente tenta falar com você - ele não precisa gritar isso na sua cara, mas você pode entender a mensagem como melhor lhe convier.

Como os folksingers da idade dele, Pug muitas vezes evita a estrutura verso/refrão e opta por uma narrativa linear, pontuada por um gancho verbal, ou uma ponte, como em "Not So Sure"; apenas violão e sua voz cansada, ele reflete sobre o amor perdido, a religião e a mortalidade. E embora ele não ofereça quaisquer revelações surpreendentes, ele caminha por uma estrada que muitos de nós andaram, polvilhando suas ideias ao longo do caminho.

Pug ilumina e expressa raiva na canção anti-guerra "Bury Me Far (From My Uniform)", uma acusação à inutilidade dos conflitos armados. Joe usa imagens que podem parecer clichê em "weeping mothers, indifferent congressmen, medals, statues, war crimes", mas ele tece todos esses sentimentos com uma trama violenta e canta a música com uma raiva controlada - como a voz de um soldado morto entoando sua bênção ou maldição sobre a vida.


"The First Time I Saw You" é uma referência óbvia a canção de Ewan MacCollchamada "The First Time Ever I Saw Your Face". Ele, Joe, pede a premissa da canção, mas a música é rock um tanto popular e a narrativa de Pug tem um final ambivalente, implicando a perda ao mesmo tempo que comemora o momento relâmpago quando o verdadeiro amor atinge o coração e transforma o mundo com a poesia.

As canções de Pug vagam por questões metafóricas e geograficamente delimitam um mapa emocional e como esses elementos se unem para revelar imagens de beleza impressionante e insights da alma. É como assistir a uma foto analógica sendo revelada e todo o processo que isso abrange, até nadar para fora do banho químico em um quarto escuro e, lentamente, mudar sua forma até o momento em que tudo se torna claro. E o que está claro aqui é que Messenger marca a chegada de um grande compositor.

Nota: 9,2