terça-feira, 30 de novembro de 2010

My Chemical Romance - Danger Days: The True Lives Of The Fabulous Killjoys (2010)



Energético, sujo, icônico, cativante... Existem muitos adjetivos para coroar o som dessa banda de rock alternativo não emo, apenas rock oriunda de New Jersey, EUA. O My Chemical Romance, ou MCR para os íntimos, iniciou suas atividades após os atentados do fatídico 11 de setembro, quando Gerard Way, frontman da banda, decidiu escrever uma canção sobre os atos terroristas. A música em questão, "Skylines And Turnstiles", se juntou a outras tantas canções, assim como se juntaram à banda Mikey WayRay Toro e Frank Iero - compondo assim o primeiro registro do grupo, I Brought You My Bullets, You Brought Me Your Love.

A partir daí, tours e mais tours mostraram ao mundo a obscura, eletrizante e cantarolável massa sonora destilada por Gerard e seus amigos. As apresentações não ficam para trás; a energia vibrante é a fusão da banda e da plateia, que não desafina e sabe de cor cada letra e ritmo. Logo depois do álbum Bullets (abreviação do trabalho já citado acima), um disco com ainda mais identidade surgiria para consolidar de uma vez por todas a presença da banda nos EUA e no mundo. Three Cheers for Sweet Revenge veio ao mundo em 2004, retomando a história iniciada no álbum anterior sobre um casal perseguido por vampiros assassinos. Se somados, temos a partir desses dois registros um conjunto de singles e ótimas canções como "Our Lady Of Sorrows", "Headfirst For Halos", "Helena", "You Know What They Do To Guys Like Us In Prison", "I'm Not Okay (I Promise)", " Thank You For The Venom" e "Cemetery Drive", dentre tantos outros sucessos mega conhecidos pelo público vibrante e incansável.

Em 2006, a obsessão por seres sanguinolentos dá lugar à busca pelo sentido da vida e questões existenciais são lançadas na forma de canções em tom de humor negro e sarcasmo. O álbum The Black Parade narra as desventuras de um paciente de câncer até o momento que ele se junta à Black Parade, onde rejeitados e injustiçados marcham em busca da libertação de seus pesares na vida. Este trabalho é muito bem aceito pelo público, mas também denota um lado até então pouco visto na carreira da banda: uma aderência sutil ao lado pop. Esta terceira bolacha da banda conta com os hits "Dead!", "Welcome To The Black Parade", " I Don't Love You", "Cancer", "Teenagers" e "Famous Last Words". Está claro que há mudanças também sutis no modo da banda executar as músicas; a pegada 'suja' dos dois primeiros trabalhos fica em xeque pelos arranjos bem executados do produtor Rob Cavallo, mas The Black Parade não decepciona.

Após o encerramento da fase anterior com o lançamento do dvd The Black Parade Is Dead, quatro anos dividiram em um hiato silencioso tudo o que o MCR construiu em sua curta, porém extensa carreira. Após segredos e especulações, uma amostra do que viria a ser o novo álbum da banda cai no YouTube: o inusitado vídeo da então inédita "Na Na Na (Na Na Na Na Na Na Na Na)". Nele, os membros da banda estão vestidos com estranhos uniformes coloridos portando armas coloridas atravessando um deserto.

- Killjoys, make some noise!

Essa é a ordem que os ouvintes do novo trabalho do MCR recebem ao iniciarem a jornada nada linear de um grupo de rebeldes em busca de justiça. Este novo trabalho é sim, bem conceitual, em controvérsia ao que Mikey Way, baixista, declarou em entrevistas: "Já fizemos três discos conceituais, então, para o próximo… não quero pensar em uma história definida. Escrevemos canções que soam como Rick Springfield, uma semana depois, se transformaram em algo como Children of Bodom. Sei que será um grande disco, só não sei como vai soar. Iremos nos surpreender tanto quanto todo mundo."

Danger Days é um álbum aparte na discografia da banda - não soa tão rock de garagem quanto Bullets ou Three Cheers, nem tão dark quanto The Black Parade. Este álbum fica, realmente, num mundo diferente, numa visão diferenciada que a banda concebeu como alguma reinvenção maluca. Seja como for, a perda de algumas características marcantes da banda são inevitáveis.

O álbum começa com a introdução do DJ Dr. Death Defying que, aliás, se faz presente em outras duas faixas - "Jet-Star and the Kobra Kid/Traffic Report" e "Goodnite, Dr. Death", que apesar de dar um tom narrativo a história dos Killjoys, acaba por soar como um tapa-buracos ao disco, exceto na introdução "Look Alive, Sunshine". A segunda faixa é a conhecida e camaleônica "Na Na Na (Na Na Na Na Na Na Na Na)", uma destoante balada rock'n'roll bem chiclete que se não gruda na mente, vicia em instantes. "Bulletproof Heart" é outra grande composição da banda e só peca por ser extensa e repetitiva da metade para o final.

"Planetary (GO!)" é uma das faixas mais diferentes vindas da banda. A música começa com sirenes intergalácticas e abre para um ritmo dançante e cheio de força que consegue levar a faixa numa batida incansável onde a letra expressa bem essa atmosfera: 'I can't slow down/I won't be waiting for you/Can't stop now/Because I'm dancing'. "The Only Hope For Me Is You" é o já citado segundo single e, se comparada com as faixas anteriores, perde um pouco do costumeiro peso das guitarras e bateria que a banda executa; por isso é uma das faixas que mais flertam com o pop e os refrões fáceis. Em "Party Poison" pseudônimo de Gerard para o personagem de cabelos vermelhos à la Ronald McDonald que ele encarna na história dos Killjoys, a banda volta com um som mais pesado e clima agitado berrando a plenos pulmões: 'Here comes the gang war/You're doin' alright/I got the answer/ 'Cause all the good times/ They give you cancer'.

"S/C/A/R/E/C/R/O/W" é uma canção vencedora: a voz de Gerard reverbera através de um efeito de eco como um rolo compressor cíclico de violão e a percussão navega em um amplo acordo. E ainda que timidamente, a banda se põe em uma situação gloriosa ao final e os deslizes anteriores são perdoados pelo requinte da ótima balada 'Summertime'. Pela primeira vez no disco, os caras têm uma grande sacada fazendo a sábia decisão de preparar o terreno delicado e sutil para então construir um hino triunfante, iluminado e contemporâneo de proporções verdadeiramente belas.

A música que se segue, "DESTROYA", vai causar estranheza na primeira audição, mas logo ressoa como uma façanha por parte da banda - os quase heavy metal riffs, misturados com os gemidos sexy de Gerard, justificam isso e fazem dessa música um achado vicioso. "The Kids From Yesterday", um futuro claro e único para o que podemos esperar da banda, é uma jóia cintilante: a banda atacando as suas angústias assim como os The Killers ou o MGMT o fazem num pop/electro glamuroso. A coisa toda termina com a revolta dos desenhos animados de "Vampire Money", quebrando a festa com um aríete de acordes e um extintor de incêndio para concluir o álbum em uma nota de surpresa e perplexidade.

MCR nunca deixou de desempenhar o papel de entreter, mesmo que com sofisticação, um público que o admira e o respeita por ser original na medida do possível. Eles caminham contra todas as direções seguidas por outras bandas do gênero que acabam por ser estritamente descartáveis. Todo grupo tem seu erro, todo grupo tem seu momento de dúvida sobre como continuar. Com o My Chemical Romance não foi diferente e para os grandes admiradores da banda meia palavra basta; dessa vez, faltou a energia presente nos álbuns anteriores. Espero, como fã deGerard e dos outros, que eles não se esqueçam nunca de quem eles são e que se mantenham afastados das mudanças quase extremas que permearam Danger Days.

Nota: 4,0

sexta-feira, 12 de novembro de 2010

Drums of Death - Generation Hexed (2010)


Bem à la Jack Skellington, a face pintada é o estilo inconfundível do Drums of Death- a.k.a. Colin Bailey. Você não estaria completamente enganado ao pensar que este álbum de estreia é, basicamente, parte da cena witch house. Em marchinhas funestas ou em batidas 8-bit mezzo Hot Chip ou mezzo qualquer outra coisa do gênero,Generation Hexed é mais sobre música pop eletrônica cantarolada do que necessariamente uma espécie de gothwave como Salem ou oOoOO.

O disco é bem bacana e vale a pena dar uma conferida, principalmente pela parte que diz respeito às diferentes sonoridades abordadas - justamente por isso, a bolacha não cai num contexto monótono e fora de linha como tanto se vê na cena eletrônica atual. O disco abre com "Karaoke", introdução onde Bailey explora um quase mantra banhado em sintetizador flutuante. Logo depois temos a impressão de um revival aos Talking Heads numa outra encarnação na faixa "Science & Reason" - algo como um jazzsofisticado com tendências roqueiras dançantes dos anos 80. Ainda assim, o hype só fica completo com o trio "Won't Be Long", "Lonely Days" e "Creak": de cara os melhores momentos do pacote.

Os synths de "Lonely Days" são de causar inveja até mesmo no mais experiente DJ e eu duvido que o ouvinte fique parado ao som futurista desta pancada sonora. "Creak" beira o desespero no seu clima dark arrastado e ambientado ao estilo da trilha sonora de algum filme de terror B - é diversão garantida para quem gosta de música ambiente. A certo momento, as batidinhas 8-bit dão um toque descontraído ao som carregado e esse contraste torna-se bem inventivo.

Bailey afirma que Generation Hexed "é a música pop nos meus termos". Ele tenta sempre descobrir como transformar a música em algo rápido, sujo e acolhedor. O disco conta com uma fórmula cativante: rave intensa como o ácido e melodias e batidas nervosas fincadas entre sintetizadores funky e muitos bleeps. A voz me lembra muito a de James Murphy, apesar de Colin gritar um pouco mais que o gordinho do LCD Soundsystem.

A segunda parte do disco não decepciona mas desacelera sutilmente; mas claro, nada que prejudique a audição desse pedacinho de céu. "All These Plans" é a baladinha para gregos e troianos. Já "Modern Age" é deliciosa para cantar junto ao coro de amigos na danceteria. O disquinho encerra com as firulas de "Voodoo Lovers (feat. Gonzales)" que, como o nome já diz, conta até com participação especial.

Muitos podem até discordar, mas se tratando de estripulias sonoras, o Drums of Deathdá um show a parte e, mesmo não lançando algo para figurar entre os melhores de 2010, dá margens ao que ainda pode-se esperar dele - pois se tratando de habilidade, criatividade e competência, Colin Bailey faz escola em muitos veteranos jurássicos do mundo da música. Para quem sabe aguardar, as expectativas para um próximo trabalho são altas - pelo menos da parte deste que vos fala.

Nota: 8,2


Joe Pug - Messenger (2010)


Joe Pug é um cara popular tentando fazer música honesta. Ele não é um grande experimentador e ele não tenta revolucionar a música. Pug usa o que outros cantores e compositores têm usado desde então: guitarra e violão, gaita e voz. Sua canções podem ser estruturadas ao estilo mais classudo do folk e elas vêm de um coração receptivo e um par de olhos abertos. Tudo parece ser tão normal, tão familiar...

E talvez esse seja o ponto de toda a matéria - Messenger é como um bom amigo ou um dia agradável de sua estação favorita. Ele tem o poder para aquecê-lo, ele está pronto para levá-lo pela mão quando ninguém está assistindo e isso te faz feliz apenas por estar perto. E assim que você internaliza todas as facetas do registro, ele não irá mais deixá-lo. Talvez isso seja um aspecto importante em chamar um álbum intimista.


Messenger não é particularmente triste - faixas como "The Door Was Always Open" tem uma boa movimentação: a instrumentação com tambores bem animados e a melodia do banjo e da gaita soam esperançosos e brincalhões. O mesmo se aplica para a excelente faixa-título, "Messenger", que conta com um som mais forte, evidente também em "Speak Plainly, Diana", que é a "mais difícil" dentre as faixas do registro. Mas ao longo destas faixas há claramente o que pode-se chamar de uma sonoridade não triste, mas nostálgica. "Disguised As Someone Else" ou "Unsophisticated Heart" são a prova viva de que, mesmo sem tanta inovação por parte de Joe Pug, a beleza extrema que a música pode assumir não deixa de ser contagiante - não é preciso ser o hype da contemporaneidade para criar músicas tão fascinantes.

Ao combinar urgência instrumental com melodias melancólicas, Pug conta histórias incrivelmente convincentes como na apaixonada "How Good You Are", que destoa em gaitas cortantes. Eu não tenho medo de dizer que Messenger é um forte candidato para o que há de melhor na lista de 2010. Se Joe canta sobre assuntos políticos, ele faz isso apenas como um bom cantor e compositor deve fazer - com estilo e não apenas por causa da provocação sem sentido. Você não tem que concordar com um bom cantor e compositor, mas você vai ouvir o que ele tem a dizer, pois ele realmente tenta falar com você - ele não precisa gritar isso na sua cara, mas você pode entender a mensagem como melhor lhe convier.

Como os folksingers da idade dele, Pug muitas vezes evita a estrutura verso/refrão e opta por uma narrativa linear, pontuada por um gancho verbal, ou uma ponte, como em "Not So Sure"; apenas violão e sua voz cansada, ele reflete sobre o amor perdido, a religião e a mortalidade. E embora ele não ofereça quaisquer revelações surpreendentes, ele caminha por uma estrada que muitos de nós andaram, polvilhando suas ideias ao longo do caminho.

Pug ilumina e expressa raiva na canção anti-guerra "Bury Me Far (From My Uniform)", uma acusação à inutilidade dos conflitos armados. Joe usa imagens que podem parecer clichê em "weeping mothers, indifferent congressmen, medals, statues, war crimes", mas ele tece todos esses sentimentos com uma trama violenta e canta a música com uma raiva controlada - como a voz de um soldado morto entoando sua bênção ou maldição sobre a vida.


"The First Time I Saw You" é uma referência óbvia a canção de Ewan MacCollchamada "The First Time Ever I Saw Your Face". Ele, Joe, pede a premissa da canção, mas a música é rock um tanto popular e a narrativa de Pug tem um final ambivalente, implicando a perda ao mesmo tempo que comemora o momento relâmpago quando o verdadeiro amor atinge o coração e transforma o mundo com a poesia.

As canções de Pug vagam por questões metafóricas e geograficamente delimitam um mapa emocional e como esses elementos se unem para revelar imagens de beleza impressionante e insights da alma. É como assistir a uma foto analógica sendo revelada e todo o processo que isso abrange, até nadar para fora do banho químico em um quarto escuro e, lentamente, mudar sua forma até o momento em que tudo se torna claro. E o que está claro aqui é que Messenger marca a chegada de um grande compositor.

Nota: 9,2



sexta-feira, 22 de outubro de 2010

The Fresh & Onlys - Play It Strange (2010)


Ao longo de poucos anos, San Francisco tem dado origem a uma nova cena de bandas pop-garagem empurrando o proto punk de 1960 em diferentes direções.  E depois há o Fresh & Onlys, que parece apaixonado pela época em que o rock de garagem e o rock-folk parecem ter se encontrado. Os caras da banda não são revivalistas, exatamente, mas eles são artistas nostálgicos. E na sua exuberante e cuidadosa  orquestração, ouvimos dimensões de qualquer número de momentos pop históricos.
Desde sua formação, há alguns anos, a banda tem mantido um fluxo constante de 7" e cassetes, sendo que Play It Strange é o seu terceiro LP, em tantos anos. Mas neste trabalho,  eles começam a puxar todas as idéias anteriores para um foco mais fácil de digerir. Para a primeira vez, eles deixaram os limites de seu estúdio, e agora eles estão trabalhando com as reais expectativas de uma banda - sem que você tenha que forçar seus ouvidos para ouvi-los.

Mesmo em sua maioria simples, o Fresh & Onlys ainda encontrar espaço de sobra para brincar nas margens de suas canções. "I'm All Shook Up" tem batidas meio New Order ou The Mary Onettes, mas os órgãos e sopros graves e profundos na mistura, adicionam os acentos melódicos para a batida. "Who Needs A Man" é uma corrida pantanosa que termina antes que você perceba, mas as sombras fantasmagóricas da exotica guitarra emana uma vibe surf que consegue manter as coisas inquietas. E depois "Tropical Island Suite" despeja todos os ares de um tempo perdido num abismo de ecos reverberantes para disparar em quase oito minutos de grandeza. Uma linha reta e simplista se dissolve em meio ao ruído abafado para, em seguida, retornar em marcha lenta. É como se a banda não conseguisse decidir qual o caminho para tocar a música, então eles optaram por todos os caminhos.
O cantor Tim Cohen tem uma voz plana, sem afeto, nem de longe tão expressiva como os seus pares com Christopher Owens ou Sonny Smith. Mas esse barítono funciona muito bem no meio da mistura, e é divertido ouvi-lo soar cansado de ser um jogador em "I'm A Theif" ou tentando fugir da sobrecarga de informação sobre a idade na nostálgica "Waterfall". Em "Be My Hooker", a letra não deixa esconder o processo saudosista que impera sobre a banda: "Eu posso ouvir o mar me chamando, mas eu não sei, eu não sei". Eles mantém concisos os temas que abordam, e todo o álbum conclui-se bem antes da marca dos 40 minutos. Que este grupo continue a escavar em vales férteis como tem feito até então, ainda por muito, muito tempo futuro adiante.
Nota: 9,2


domingo, 10 de outubro de 2010

Avey Tare - Down There (2010)



Dave Portner (aka Avey Tare) nasceu no condado de Baltimore, Maryland, em 24 de abril no ano de 1979. Ele se mudou para New York City em 1997, onde reside até hoje no Brooklyn. Embora ele tenha passado a maior parte do tempo dele a escrever canções e produzir sons (normalmente para o grupo dele, o Animal Collective), também é um colecionador de discos, cinéfilo, e leitor exemplar além de um lunático viajante. É nestas coisas principalmente que o Sr. Portner retira inspiração, ainda com fôlego para misturar sons e descobrir territórios musicais que parecem estranhos. Seus animais preferidos são a lontra e o jacaré. 

A tarde tem desempenhado um grande papel em seu mais novo registro, Down There. O disco de Avey Tare resume-se num mundo de nove canções inéditas em que seu solo oficial completa uma importante tarefa no que diz respeito á versatilidade de Avey. Down There te leva por um mundo obscuro de som, um mundo alienígena onde a morte está presente através de ranhuras que penetram fundo na alma, um trabalho honesto e sobrenatural. 

Aguarde o pôr do sol e transforme-o em voz alta, pegue uma carona neste barco assombrado e deixe-se guiar através de profundos ritmos lentos e flutuantes que revelam um pop contemporâneo, cristalino e nítido. Down There teria sido inspirado por crocodilos (os répteis, não a banda de San Diego) e foi gravado no mês de junho desse ano pelo velho amigo de Avey, Josh Dibb ( Deakin) na Good House, uma antiga igreja em Nova York cercada por um grande pântano e visitada regularmente pelos monges, as viúvas brancas e o coachar incessante dos sapos. 

Em quase sete minutos de duração, a faixa de abertura "Laughing Hieroglyphic" leva o seu tempo mergulhando o ouvinte em diferentes camadas de som viajante levado por batidas eletrônicas, passando a letra "It’s so easy to get lost in the mixture", - parece apropriado. Se reverberando ou silenciado, Avey brinca com a voz ao mudar o papel tradicional de tocar a canção. O que realmente está sendo dito tem um papel secundário para os sons que as palavras criam.

 "Oliver Twist" continuamente constrói uma batida geralmente associada à casa. Mas assim como ela pega velocidade e potencial para se tornar dançante, o ritmo diminui e dispersa. “Lucky 1″ foi a música escolhida para divulgar o trabalho solo e como os fãs provavelmente vão notar, há uma boa semelhança com as faixas que Avey compôs para o álbum “Merriweather Post Pavilion”, do Animal Collective - em especial momentos mais “tortos” como “Lion In A Coma”.

Down There (como um todo) é muito coeso com cada transição, indo sem problemas para a faixa seguinte mantendo um ritmo constante e uma qualidade meio aquosa - como as criaturas reptilianas que inspiraram o trabalho. 


No entanto, enquanto não há um fio condutor do início ao fim, cada música intenta ainda transmitir algo diferente. No caminho em que alguns escritores adquirem um estilo inconfundível, Down There é sem dúvida o trabalho de um membro do Animal Collective. A séria quantidade de detalhes que são construídos em cada música e o modo como este se depara, não é completamente território desconhecido. Mas se você é ou não fã da banda, ao ouvir o álbum, terá uma idéia melhor do que Avey Tare traz para o coletivo.


Nota: 8,6

quarta-feira, 6 de outubro de 2010

Crystal Fighters - Star Of Love (2010)

No que diz respeito ao falatório da imprensa, especula-se que o Crystal Fighters teria sido formado após a vocalista Laure descobrir em casa um insano diário de seu avô, já falecido. Este diário continha o esqueleto de uma ópera incompleta e ainda por cima sugeria o nome da banda que Laure formaria mais tarde. A jovem prometeu honrar a memória do avô através do recrutamento de um grupo para continuar o trabalho iniciado pelo ancião - um trabalho bem arrojado, diga-se de passagem.


É quase certo que toda a história por trás do Crystal Fighters é uma mentira, mas isso bate bem para a banda formada na garagem que tem a pretensão de ser um dos grupos mais repercutidos nos gráficos. A estreia do disco Star Of Love é tão colorida quanto o conto fantasioso narrado acima pela própria vocalista, mas a fusão dos gêneros tradicionais da música dançante de raiz européia agrega vários tons e não se mostra como uma ideia particularmente nova. Ou seja, é um pouco de rock batendo contra algo barulhento o bastante para sugerir alguma coisa distinta do que se tem feito até então.

A escuridão febril com a qual você provavelmente estará familiarizado após alguns minutos de audição, soará como se tivesse passado algum tempo nos pontos fashion do leste de Londres. É o que você pode ouvir na ótima "Champion Sound", uma canção que leva a melodia suave da arrancada de violões e tece um ritmo tão urbano que se assemelha a agitação das capitais. Assim como é evidentemente expresso nos festivos batuques de "Plage" - uma mistura entre Vampire Weekend e Kings Of Convenience.

Linguisticamente, os CF são brincalhões e muitas vezes redefinem a frase original ao longo de uma música, misturando-a à sintaxe simples mas eficaz - eles se movem em uma arena mais realista do que aparentam seus sons vocais. "At Home" tem percussão handclap e irreprimíveis simulações como as do flamenco, mas sua letra é um pouco molhada, dependente dos vocais femininos que se tornam muito polidos em relação às encarnações de seus colegas do sexo masculino. Melodicamente, "At Home" atrai influências como o ABBA, tanto no ajuntamento vocal quanto nas mudanças de acordes clássicos, o que torna a dança mais enérgica.

Mas as que parecem ser as ofertas mais fascinantes em Star of Love, no entanto, são as canções "With You" e "Follow", tomando-as primeiramente com a sua descendência ensurdecedora em basslines e dubsteps sintéticos que se encaixam perfeitamente dentro da serenata de violões espanhóis. "Follow" tem uma batida mais trance, usando táticas divergentes para cair fora de todos os elementos banais, além dos sintetizadores e vocais em crescimento contínuo de repetição, que tornam a canção bem interessante.
"Xtatic Truth", que foi lançada como single no ano passado pela Kitsuné - um rótulo que, aparentemente, existe com o único propósito de liberar músicas de atos conscientes das raves européias tão bem representadas na figura dos Crystal Fighters-, soa frenética e eufórica. Na verdade, soa muito parecida com o grande hit do quase decepcionante último registro dos Klaxons. Então há "I Love London", outro single anterior - notável para verificar o nome, mais precisamente o noroeste de Londres, posto de Willesden.

Star Of Love não é bem a estreia que justifica uma história tão ousada quanto aquela narrada por Laure sobre seu avô. Mas, em sequência, no meio do disco, é uma tentativa mal-avaliada de um hino que esbarra um pouco perto demais da música incidental em um desses comerciais que lotam as TV's. Mas também é uma certeza de que, esporadicamente, o primeiro tiro foi emocionante. Independentemente de como o louco avô de Laure realmente era, ele tem todo o direito de estar razoavelmente encantado com a forma como o trabalho da neta foi visto através do que se pretendia. E com razão...


Nota: 8,4

domingo, 26 de setembro de 2010

Sufjan Stevens - The Age Of Adz (2010)



Depois do deleite inicial com o EP All Delighted People lançado em agosto, você pode pensar que o seu conteúdo serve como uma lembrança simpática e humilde de canções que merecem ser ouvidas, mas que pertencem a um capítulo na vida artística de Stevens que ele precisava enfrentar para encerrá-lo. Em The Age Of Adz, talvez você pense a mesma coisa, mas estaria errado sobre isso. The Age Of Adz soa exatamente como tudo o que Stevens já gravou antes. A melodia forte e o fraseado trancados com arranjos sinfônicos e a alegre cacofonia de buzinas nos convida a relembrar álbuns como Come On Feel the Illinoise e Michigan, ainda envolto em uma camada de batidas e bleeps.

Sufjan Stevens sempre usou traços largos, mas nunca de forma mais eficaz do que emThe Age Of Adz. Não estou dizendo que este é um álbum excelente, pois tem um limite rígido e brilhante que fere o senso de eufonia de qualquer um. Além disso, faixas como "Bad Communication" não funcionam no todo. O foco insiste na dissonância enquanto ao fundo ecoa algo como o que um estudante de arte faria em seu laptop ao escrever um ensaio sobre o Surrealismo.

O disco é firme em detalhes melódicos como nos álbuns anteriores mas tem uma infinidade de encantos. Em Adz, você pode encontrar o mesmo tipo de harmonias corais encontrados num musical do Mágico de Oz ou outros filmes da mesma época, deliciosamente imaginados como os ritmos de um ônibus escolar que dá solavancos e o uso comedido e incomum de dissonância permanente. A ideia original por trás doprog rock costumeiro, foi elevar o rock a um novo nível de credibilidade artística como em "All for Myself", uma canção que varre através de movimentos como uma sinfonia. "Futile Devices" é a cereja do bolo; ecoa nos translúcidos vocais e em doces dedilhados que induzem ao sonho, tornando-se o principal atrativo do álbum.

"Too Much" é a estranha da vez. Cheia de reverbs e batidas ocas como o som de um pica pau insistente na madeira, essa canção é uma indigesta prova das habilidades excêntricas de Stevens. "Age of Adz" é outro produto pouco usual saído do repertório experimental do cantor. "I Walked" conta com o tom operístico, característica marcante no currículo de Stevens e "Now That I'm Older" é balanceada entre cadência monótona e coral, enquanto que "Get Real Get Right" (depois de desgastada audição do resto do disco), não apresenta lá grandes inovações. "Vesuvius" é comedida, bela e destoa da alquimia moderna e confusa de "I Want To Be Well" e "Impossible Soul" - esta última faria bonito num remix dançante.

Para quem esperava por The Age Of Adz como mais um item para complementar a famosa lista de melhores do ano, talvez acabe por se decepcionar. Não é um trabalho ruim, mas previsível e repetitivo que se utiliza de táticas confusas para chamar atenção. Como já havia questionado em um post anterior, o que leva alguém com uma voz tão linda e uma criatividade fantástica como Sufjan Stevens a consumir-se em canções estranhas e distanciar-se tanto de suas obras primas (leia-se Illinois e Seven Swans)? Cada qual com seus motivos, Stevens continua a ser ainda um gênio pouco funcional para os dias de hoje e não passa disso.


sábado, 18 de setembro de 2010

Deerhunter - Halcyon Digest (2010)


Bradford Cox e seu Deerhuntertêm usado uma variedade impressionante de ideias e uma estética instrumental contemporânea para expressar sua ansiedade e alienação, todos sob a forma de canções pop em álbuns concebidos para serem mais do que a soma de suas partes. Além disso, eles absorveram os "UK ícones" do rock como ninguém - abraçando os anos 50 e o pop dos anos 60 intensamente.

Em Halcyon Digest, a banda entra em sua própria sintonia, aplicando suas próprias perspectivas inspiradas e uma sensibilidade distinta, desoladamente apelando para tudo engrenar em ideias inovadoras para movê-los. E essas ideias embarcam em parte do conjunto de músicas lânguidas que determinam os primeiros e últimos momentos do álbum e de quebra conduzem o disco de maneira muito mais ambiente, em interlúdios divididos. Só que desta vez, a calmaria dura apenas 10 minutos e a sua estrutura é bem mais acessível.

Deerhunter tem uma extensa e bonita carreira para demonstrar e quanto mais você escutar seu último lançamento, mais recompensas você terá. Variando do translúcidopsycho-pop-rock de garagem, eles estão alternadamente assegurados e vulneráveis, direta e sutilmente como claro no escuro. Suas repetições planejadas a dedo variam entre a linha habitual, ganchos lo-fi e o hipnotismo com deslocamentos pop nos melodiosos anos 60 dosados com dopamina e surtos. Quanto ao título do álbum, Coxexplicou:

"[Halcyon Digest] é uma referência a um conjunto de boas lembranças e até as que foram inventadas, como a minha amizade com Wilson Ricky ou o fato de que eu vivo em uma fábrica abandonada. A maneira como escrever, reescrever e editar nossas lembranças para ser uma versão de digerir o que quer."

Cox é uma personalidade colorida e carismática, aquele que empurra os limites de entrevistas e brincadeiras no palco; mas no final do dia, a música do Deerhunter é dos anos 80 e 90 soando um indie mais nostálgico (o mesmo poderia se dizer para o abstrato Atlas Sound). É parte da razão que atinge tantas cordas com um público tão diversificado. Ele faz um ótimo trabalho de reprocessamento (e digerir) os sons do passado através de sua estética colagista própria.

Retomando a ausência reverberante de Cox, ela se faz bem expressiva na faixa de abertura do disco, "Earthquake". A cadência confusa e os vocais distantes não só vão contribuir para a beleza das outras faixas mas também fundir o lirismo na maioria das vezes sensível e expressivo da banda com a estética da ambientação etérea e sensual, sendo estes dois atributos a principal condução para "Sailing" - rica em melancolia e solidão que transbordam num adocicado e honesto lamento de uma vida fustigada pelo cansaço.

Em contraposição, "Memory Boy" é toda satisfação dentro de seu domínio festivo, mas nunca explosivo. "Desire Lines" transmite uma pressa psicodélica que é um verdadeiro achado no currículo da banda e ainda assim, o som é exuberante, em camadas. E o que falta em rock, torna-se propício para fones de ouvido em um ambiente tranquilo. Quando dizemos que a estética de Cox tende a olhar para trás, não é concebida como um pejorativo. Halcyon Digest é um álbum maravilhoso e Cox tem um dom para despejar material polido em nostalgia mais que sincera.

Quanto à nostalgia, é o tema mais rico aqui. A faixa "Revival" soa como a trilha sonora para uma dança da High School dos anos 50. O mesmo vale para "Don't Cry", que poderá igualmente funcionar como uma canção do Girls."Basement Scene" intencionalmente acena para a calmaria dos ensolarados primórdios da banda enquanto o single "Helicopter" é uma colagem pop muito bem sacada. "Fountain Stairs" possui a subjugada rebeldia do Deerhunter e "Coronado" destaca-se pelo seu saxofone. A partir de todos estes elementos que destilam o "psych spacey" característico, de alguma forma soa como canções que Cox gravou sozinho em seu quarto.

Na medida do clímax, a coleção se encerra com seu bonito momento em "He Would Have Laughed", um brilhante looping de 7 minutos dedicado ao falecido Jay Reatardque se distingue como parte de alguma canção do Magnetic Fields; parte eletro-barroco até a batida que soa como o que Cox vem fazendo nos shows do Atlas Sound ao vivo recentemente.

Ninguém pode saber, mas secretamente, Halcyon Digest nada mais é que uma folha lacônica e bonita de uma das páginas do diário de um atônito Bradford Cox que se desprendeu do restante e agora eterniza um happening.

Nota: 9,4